domingo, 29 de janeiro de 2017

#113 - Entrevista com Paulo Pereira Netto.




Fale-nos um pouco de você?

Não sou natural de Pedro Leopoldo. Mas assim me considero, pois a primeira vez que aqui estive foi em meados de 1966, quando fui contratado pela Cia. Industrial para trabalhar na Fábrica de Tecidos Cachoeira Grande.

Em princípios de 1968 saí de Pedro Leopoldo. Voltando para cá em fevereiro de 1975, para trabalhar novamente na Fábrica Cachoeira Grande, onde permaneci até 1992, quando infelizmente a mesma veio a falir.

Trabalhei mais um ano na indústria têxtil, vindo a seguir me aposentar. Parti então para novos desafios, lecionando inglês no Free Way por 8 anos e depois ingressei no Hotel Tupyguá onde trabalhei por 10 anos.

Em meados de 2012, assumi definitivamente a minha condição de aposentado,  passei a me dedicar ao estudo da Mobilidade Urbana Sustentável, tendo como objetivo pessoal,  mostrar aos cidadãos e gestores pedroleopoldense o erro que estamos cometendo com a nossa cidade em transformá-la em uma cidade rodoviarista.


As ciclovias e o micro  ônibus sendo implementados em Pedro Leopoldo estarão contribuindo de alguma forma para fazer com que as pessoas adotem o estilo de vida desmotorizado na cidade?
Certamente, sim. 
E o que  constatamos é que a implantação de ciclovias estimulará mais gente a usar a bicicleta na cidade. De 334 pessoas entrevistadas, em enquete por mim realizada, 69% disseram que usariam mais a bicicleta e menos o carro.  
Além disso, esse uso se tornará mais frequente e maior com o tempo, pois as ciclovias segregadas farão as pessoas se sentirem mais seguras e mais confortáveis andando de bicicleta em Pedro Leopoldo.
No caso dos micro ônibus confortáveis, isso também fica claro, pois nem todos gostam ou podem andar de bicicleta.

Quais são as características de uma cidade mais humana e inclusiva? E como, urbanistas, planejadores e incorporadores podem projetar e desenvolver ruas que estimulam a caminhada e o uso da bicicleta?

Há muitos exemplos ao redor do mundo, onde mais ruas que se recriam para pedestres e ciclistas. Entre muitos fatores e elementos que elas possuem em comum, o mais importante é o gerenciamento da velocidade dos veículos. Quando a velocidade dos carros excede os 36 quilômetros por hora, a qualidade humana nas ruas começa a perder; o barulho aumenta, tornando as conversas mais difíceis; além do perigo que cresce de forma exponencial, tirando as pessoas do espaço público. Uma vez que as pessoas passam a evitar a rua.  Você perde um ciclo virtuoso de pessoas atraindo pessoas e, eventualmente, entende que a perda dessa experiência destruirá um bairro e até uma cidade inteira.

É possível viver sem o carro?

Vou citar o exemplo do jogador de futebol, ídolo do São Paulo, Raí, (entre muitos outros que temos) que não anda de carro. Morou muitos anos em Paris e em Londres e por lá ele não tinha carro. Quando voltou fez um experimento para ver se conseguiria viver aqui do mesmo jeito. Raí descobriu que essa escolha era maravilhosa, que ele não precisava sofrer atrás de uma vaga quando saía, se preocupar se o carro seria roubado, se poderia beber ou não... Ele descobriu que a vida é muito mais livre assim. Hoje ele faz tudo de bicicleta, inclusive visitar a netinha e diz que largou o carro em prol da felicidade pessoal.

Pessoalmente, quando você se deu conta que ruas mais atrativas para caminhar eram determinantes para a qualidade de vida nas cidades? Por meio de quais ações podemos fazer as pessoas entenderem isso da mesma maneira?

No meu caso, foram nas minhas viagens à Alemanha onde tive  essas  experiências reveladoras. Antes de caminhar por aquelas   ruas pela primeira vez , eu pensava que ruas eram apenas para os automóveis, pois só conhecia ruas assim aqui no Brasil. Mas as ruas das cidades Alemãs, restringem os carros ao mesmo tempo que permitem ônibus, táxis e, claro, bicicletas. O resultado foi uma revelação: a rua era mais calma, segura e movimentada em um ritmo mais humano. Ao caminhar ou andar de bicicleta por essa rua, você está constantemente fazendo contato visual com outros, vendo rostos, vitrines de lojas e fachadas em uma velocidade em que realmente pode absorver o momento, sentindo-se seguro e respeitado no seu espaço. É uma experiência sútil, mas profunda, que te enriquece em um nível fundamental. Nós somos criaturas sociais por natureza e precisamos andar e interagir com outras pessoas, mesmo que sejam “estranhos”. Todos deveriam poder experimentar algo assim na vida e se dar conta de como as ruas podem ser e o que se perde quando se cede espaço demais para os carros. A melhor maneira de propagar essa ideia é mostrando esse fenômeno.


Na sua opinião, o que é mais promissor em termos de transporte e mobilidade para  áreas metropolitanas que se expandirão ou venham a surgir?
Até 2030, espera-se, que a maioria das cidades terão  reduzido para  30 km/h os limites de velocidade de suas ruas. Os benefícios disso para a segurança e a economia estão se tornando cada vez mais evidentes, e o impacto no tempo de  viagens  é desprezível em cidades pequenas iguais à nossa. Também de maneira significativa veremos a era das “ruas completas”, que fornecem espaço e prioridade para pedestres, usuários de transporte público e ciclistas junto aos motoristas. Veremos ruas com vias exclusivas para carros como coisas do passado e vamos nos perguntar como pudemos planejar e construir ruas sem faixas também para outras alternativas e amplo espaço público para pedestres. A razão para isso acontecer é bem simples: as pessoas passarão a votar pensando assim e a se mudar para ruas, bairros e cidades que reduzem os riscos trazidos pelos carros  e abrem espaços para as pessoas.  Cidades que não fizerem isso, vão ficar para trás e assim estarão falhando em atrair talentos e investimentos.

É possível mudar a paixão pelo carro em PL?

A paixão da cidade de Pedro Leopoldo por carros é uma paixão nova(em torno de +-20 anos e devido a isto acredito ser possível sim mudar essa paixão. Mas ainda assim o desafio é grande. 

Na teoria, sete entre dez pedroleopoldenses aprovam a ideia de trocar o carro pela bicicleta. Mas na prática, nem todos estão dispostos, apesar de Pedro Leopoldo ser uma cidade tradicionalmente de cultura ciclista e o relevo das vias urbanas facilitar a vida delas.
Mudar a dependência do carro em Pedro Leopoldo vai ser difícil, mas não impossível.
Há mais ou menos 25 anos atrás, Pedro Leopoldo e Governador Valadares eram as cidades mineiras mais amigas da bicicleta. De lá para cá sem percebermos, cada ano menos bicicletas e mais carros nas vias...
Hoje, o excesso de carros e seus incômodos faz muita gente começar a pensar em utilizar mais a bicicleta novamente.
Basta para isto uma ajudinha da administração da cidade em prol da bicicleta e teremos o título da cidade das bicicletas de volta.

Se isso não acontecer, o que podemos esperar em matéria de qualidade do ar e mobilidade na cidade?
Acredito não ser necessário responder a essa pergunta, pois todos já sabem a resposta, não é mesmo?


domingo, 22 de janeiro de 2017

# 112 - O Invisível Respeito à Bicicleta nas ruas


 Pedalando pela cidade é possível perceber, cada vez mais, que embora nós tenhamos muito a evoluir como sociedade ainda, as pessoas se respeitam mais do que a gente pensa. Na maioria das vezes, nós, ciclistas, acabamos nos apegando a uma ou duas buzinadas que recebemos de motoristas impacientes. No entanto, muitas vezes não lembramos das centenas de veículos que cruzam nossos caminhos de forma respeitosa, ultrapassando a bicicleta com distância segura, reduzindo a velocidade, ou pacientemente seguindo-nos até a próxima oportunidade de nos ultrapassar.

É natural que as buzinas e os xingamentos sejam frustrantes, visto que a agressividade sempre é mais marcante do que o respeito. Mas diariamente, observando a vida urbana, sentimos que o respeito está vencendo essa batalha. De lavada!

Desafogando a cidade


A importância da bicicleta nos deslocamentos urbanos vem crescendo exponencialmente. Segundo dados da ANTP, entre 2003 e 2013 a ciclomobilidade no Brasil cresceu mais de 50%. Grande parte desse aumento ocorre porque diversos agentes envolvidos nos processos urbanos tem abraçado a causa, tais como: associações locais, grupos de ciclismo, universidades e até mesmo órgãos públicos.

Outro fator importante é a própria mobilidade das cidades, principalmente brasileiras, cujas capacidades viárias estão praticamente esgotadas, fazendo com que carros e transporte público fiquem cada vez mais tempos parados no trânsito, aumentando muito a conveniência do transporte de bicicleta.

Essa ascensão da bicicleta também possui um papel importantíssimo no aumento do respeito ao ciclista, afinal, quem não possui um amigo que se transporta na magrela? Esse respeito existe sim, e já faz parte do nosso subconsciente.

O respeito à bicicleta precisa ser visível

Perguntando aos amigos o porque deles não pedalarem, as respostas mais frequentes são relacionadas ao medo dos automóveis e à falta de infraestrutura. Acontece que os riscos advindos do pedal na maioria das vezes são superestimados.
É prudente e natural do ser humano ter aversão ao risco. E os motoristas, que concentram seus deslocamentos em vias expressas e arteriais, não enxergam o respeito ao ciclista, mesmo que eles próprios o respeitem. Parece contraditório, e é. No fim das contas, ciclistas acham que não são respeitados, e motoristas não enxergam o próprio respeito.
Para tornar visível esse respeito ao ciclista é necessário, também, criar infraestrutura exclusiva para a ciclomobilidade, tornando-a literalmente visível para toda a cidade. Alguns fatores como a  velocidade das vias, a escala das ruas e o tamanho dos carros, fazem com que o próprio ciclista se torne invisível para os motoristas, minimizando todo o respeito que ele recebe quando se desloca pela cidade. Implementadas estrategicamente junto com ciclovias, ciclofaixas e ciclorrotas, são políticas públicas voltadas para sinalização, educação e fiscalização do trânsito que vão ter esse papel. O trânsito está mais humanizado, temos apenas que trazer isso para a consciência social.
Mas não esqueça de fazer a sua parte. Discuta com amigos, familiares, e principalmente com o prefeito e vereadores. 
Finalmente, é importante dar continuidade aos trabalhos de conscientização. Precisamos trazer atenção para comportamentos seguros e defensivos no trânsito, evoluir muito no que diz respeito à democratização do acesso a cidade e aumentar o respeito entre os diferentes modais de trânsito. Mas são pequenas ações que ajudarão a fortalecer o respeito dentro da cidade.Independente do seu meio de transporte, sorria para a cidade, quando você se lembrar. Na maioria das vezes, verá que ela sorrirá de volta para você.