sexta-feira, 21 de abril de 2017

# 116 -A revolução dos ciclistas invisíveis

Sim, é possível viver a cidade de outra forma que não seja pela ótica do caos no trânsito. E é isso que faremos nesse espaço destinado a uma discussão mais específica sobre o uso da bicicleta na cidade de Pedro Leopoldo.
Em vez de pensar a cidade como um grande estacionamento, iremos tratar de uma outra sensibilidade no espaço urbano: de como a construção e fortalecimento de uma cultura da bicicleta pode transformar cotidianos.  Temos total condição de participar ativamente de projetos e políticas públicas que melhoram a qualidade do nosso ‘ir e vir’ na cidade. E isso depende também de como as práticas culturais e a educação para a mobilidade urbana são produzidas pela sociedade e suas instituições.
A intenção não é incentivar um duelo entre carros e bicicletas, acima disso está a necessidade de mostrar os valores distintos em relação ao uso desses dois modais na cidade, como também os impactos gerados pelo modo como nos comportamos a partir do momento em que saímos de nossas casas e nos deparamos com a cidade e todos os seus problemas.
É equivocado associar a mobilidade urbana ao nível de congestionamento que uma cidade pode apresentar. A mobilidade urbana não é uma experiência exclusiva de um grupo particular – como muitos que usam o transporte individual podem pensar. Se as pessoas têm sofrido com o número de acidentes, poluição ambiental, congestionamentos que tomam muito do nosso tempo, quadros de estresse e cansaço físico, é sinal de que estamos passando por um estado de crise da mobilidade urbana, onde esses efeitos colaterais têm impossibilitado o desenvolvimento de cidades mais justas socialmente.
Pedro Leopoldo tem buscado o mesmo caminho das grandes cidades, ao adotar uma cultura do automóvel que subordina todas as outras formas de deslocamento, colocando sempre a prioridade do pedestre, ciclista e transporte público como secundárias e marginais. Mesmo que as orientações dos planos nacionais e internacionais se posicionem a favor do desestimulo ao transporte motorizado e reforçam a construção de uma nova política que colocam as coisas no seu devido lugar, como a prioridade dos pedestres e o uso do transporte não motorizado – no caso a bicicleta.
O cenário é de uma cidade estacionamento e especialista em destruir as nossas árvores.
Tomar a cidade como se ela fosse uma garagem individual é tão naturalizado quanto deixar o seu carro estacionado em local proibido por alguns minutinhos como se não fosse ‘ferir ninguém’. A cultura do carro faz com que as pessoas negligenciem a sua responsabilidade com o outro, com a cidade, com os problemas da cidade. Toda a percepção é tida por um ângulo de dentro da sua casa móvel, da sua particularidade e do bem tão desejado e adquirido. Isso não significa tomar como direito ultrapassar os limites dos espaços. As ruas não são feitas para os carros! São feitas para que as pessoas façam o bom uso é preciso também que os gestores públicos vejam a cidade com outros olhos, sob a perspectiva da prioridade dos pedestres, ciclistas e do transporte público. Enquanto tivermos gestores ‘carrocratas’ o discurso de cidade sustentável estará muito longe da prática.
Vislumbramos uma cidade onde o espaço do trânsito não seja uma luta desigual e por isso acreditamos no potencial da bicicleta. Não apenas por um direito de usá-la com segurança, mas o que está em jogo é algo muito mais amplo. A bicicleta (re)surge como contraposição a uma cultura que precariza a condição da mobilidade geral. É um veículo que representa tudo o que vai de encontro à cultura do carro: a não poluição ambiental, a liberação do fluxo do trânsito, a celeridade e capacidade de mobilidade no centro urbano. Bicicleta é saúde, é menos barulho, é qualidade de vida, é economia financeira e ainda fortalece a relação indivíduo-cidade. 
Toda a cidade, em sua maioria, é ideal para ela. Basta vontade política, basta criar estratégias para o fortalecimento da cultura de cidade ciclável e caminhável.
Por uma cidade real nos propomos a pensar, analisar, apresentar e atuar junto a um cenário que tem ganhado força nos últimos anos. O efeito pedalada, como diz antropólogo francês Marc Augè, já acontece há tempos. Basta parar por alguns minutos em qualquer ponto da cidade e esperar para contar dezenas, centenas de ciclistas para lá e para cá. Silenciosos, invisíveis, eles seguem o seu percurso diário e muitos ainda nem sabem que já fazem revolução.

domingo, 9 de abril de 2017

#115 Declaração de amor à cidade.

Quando falamos da necessidade de implantar espaços seguros para a bicicleta e colocar o pedestre como referência no planejamento, fazemos uma declaração de amor à cidade. A bicicleta é um vetor de ocupação do espaço que trará as pessoas às ruas, facilitará às novas gerações a descoberta da história da cidade, da geografia, dos rios e da vida urbana como um todo.
Deixar o carro para as verdadeiras necessidades é crucial. Precisamos entender isso e garantir as prioridades já estabelecidas pela lei da mobilidade urbana: prioridade do não motorizado sobre o motorizado; do coletivo sobre o individual.



Pensando isso em termos de nossa cidade de Pedro Leopoldo, inserir as bicicletas nas vias lentas é o caminho natural para criar uma rede de acesso à cidade, integrando aos poucos a bicicleta com o próprio transporte coletivo, com bicicletários nos terminais, com as futuras bicicletas compartilhadas e com as redes cicloviárias dos bairros. Precisamos urgentemente tornar a bicicleta uma opção segura para a população de Pedro Leopoldo. Criar essas estruturas irá induzir o uso de um modal que favorece a autonomia, a saúde e a ocupação cidadã do espaço público; melhora o trânsito e o ar que respiramos; dessa forma, deve ser entendido como política transversal de mobilidade, saúde, segurança e meio ambiente.

O mais importante disso tudo talvez seja a discussão que se coloca sobre a mortandade no trânsito no Brasil. Precisamos reafirmar a discussão sobre morte zero no trânsito e, para que isso não seja apenas uma utopia, precisamos de políticas públicas que acalmem o trânsito nas cidades. A Via Calma é exemplo de ação que fortalece essa discussão. Isso não é apenas sobre bicicletas, é sobre uma nova forma de nos relacionarmos com a cidade.


Devolver a cidade aos seus habitantes é um desafio que trás obrigatoriamente ao debate a readequação dos espaços urbanos e a reavaliação da matriz viária. A conhecida bicicleta recupera seu espaço, sequestrado pela cultura automobilística trazendo  um efetivo aumento da qualidade de vida pessoal e comunitária, além de eficiente meio de locomoção.