sábado, 12 de março de 2022

# 154 - Da forma como nos deslocamos na cidade


Há dias, na televisão pública, o Vereador da Mobilidade e Urbanismo de Gent – Bélgica, dizia que foi ameaçado de morte e teve que ter escolta policial quando, em 2017, implementou o plano de tráfego automóvel que proíbe que os carros consigam ir de uma ponta à outra da cidade em linha reta.

Imagine que agora ir de carro do Bairro S.José  ao Final da  Comendador Antonio Alves, obrigava a uma deslocação maior, não sendo permitido fazê-lo em linha reta, mas se se fosse a pé, de bicicleta ou de transporte público se conseguia ir em linha reta..

Os processos de mudança causam sempre desconforto, demora tempo até se criarem novas rotinas, novas dinâmicas, e é habitual que nesse processo o ser humano fique “irrequieto”, chateado e reclame, sendo que alguns ultrapassam até limites aceitáveis de reclamações. No final do processo o objetivo é alcançado e a população acaba por ficar agradada com as novas dinâmicas.

Qualquer cidade que tenha passado pelo processo de mudança do espaço público teve situações semelhantes. 

O espaço exageradamente dedicado ao automóvel leva também a um outro fenómeno, já demonstrado em diversas cidades. As pessoas sentem-se compelidas e obrigadas a andar de carro incutindo-lhes o medo de ir a pé ou de bicicleta.

As pessoas têm até medo de deixar os filhos serem autônomos, nas suas deslocações, ao ponto de os irem levar e buscar à 300m  de distância de  ou para onde se dirigem. 

Ao analisarmos as matrizes origem-destino vemos que 79% das deslocações de carro são urbanas, e em distâncias inferiores a 3 km. Porquê? Porque não temos infraestruturais criadas para potenciar a deslocação a pé ou de bicicleta de forma a garantir que essa deslocação vai ser pacífica, e não vai ser estressante ou perigosa, nem para garantirmos uma deslocação rápida e cadenciada do transporte público.

O fato de estarmos numa cidade já consolidada não é um problema para a reorganização do espaço público. Esta reorganização pode ser feita de forma a serem as pessoas a escolher o seu modo de deslocação, sem terem medo. Não é preciso uma cidade desenhada a partir de uma folha em branco para se fazerem alterações comportamentais nas formas de deslocação.

O século dos túneis, dos viadutos, das variantes acabou. A sociedade quer soluções de transporte público, quer poder usar a bicicleta e andar a pé na cidade.

Qualquer político com visão de futuro, com o olhar no século XXI, aposta nestas três frentes e desiste de apostas no automóvel.


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